Leondenis Vendramim

A imprensa e nossa língua 5

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Leondenis Vendramim é professor de Filosofia, Ética e História (Foto: Arquivo pessoal)

O Brasil é um país continental, cada região tem seu linguajar peculiar; a língua é viva, influenciam-se mutuamente e é influenciada pela mídia e pelo estrangeirismo. Palavras formam-se, deformam-se e transformam-se, aparecem e desaparecem.

Poucos se lembram de termos como arco de pua, enxó, brotinho (mocinha nova), caneta-tinteiro, mata-borrão, pera (sinônimo de para) e ou interruptor (não fruta). A computação trouxe muitos vocábulos novos, mas a globalização uma enxurrada deles. Dr Luís Antônio Albiero disse com sabedoria, ao introduzir meu livro A Curiosa Origem das Palavras, “cada palavra é um poema”.

A etimologia e a semântica das palavras mostram suas atividades vitais. Castro Alves assim se expressou na sua poesia Língua Portuguesa:

Amo-te, desconhecida e obscura,
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela,
E o arrolo da saudade e da ternura.

Além de designar o órgão muscular e assemelhados, língua é o conjunto de palavras, expressões e regras gramaticais usadas por uma nação como meio de comunicação. Graças às suas metamorfoses ela pode ser viva, quando em uso pelo povo; morta quando não faz parte do cotidiano, mas é estudada, como a latina e a grega Koiné (popular); e extinta quando só a história registra sua existência, como a acadiana, extinta em 2350 a.C., falada pelos assírios e babilônicos da mesopotâmia antiga, a alana dos bárbaros no norte da África, ano 1000.

O idioma majoritário de um povo pode sufocar o menos usado e este pode tornar-se morto, ou mesmo, extinto. O latim era a língua oficial dos romanos, a chamada “sermo urbanus” (conversação de cidadãos) usada pelos mais cultos como Cícero, Augusto, e o usado pelo povo “sermo vulgaris” (conversação dos comuns), foi levada pelos soldados a todo império, originando-se os dialetos português, francês, etc.

A portuguesa recebeu maior número de vocábulos latinos, porém recebeu muitos outros dos árabes (séc 18); os gregos contribuíram indelevelmente tanto histórica como linguisticamente; diz Alpheu Tersariol que é impossível escrever bem o português sem conhecer o grego.

A língua condena os loquazes, cujas palavras ocas, fúteis, sem força de expressão, ou adequação de sentido, como inoperantes e indigentes palradores. Para deixar de respirar os miasmas da ignorância, a juventude estudantil deve porfiar pelo conhecimento etimológico e semântico.

Numa reunião de professores a palestrante enfatizou: “Os professores devem tomar cuidado com os erros de ortografia”, mostrando um desconhecimento da etimologia, pois ortografia é formada de duas outras palavras gregas: ortós, significa correto e grafia, escrita, logo, não pode haver erro na ortografia.

O idioma português recebeu mais de 120.000 elementos de europeus, asiáticos, africanos, americanos, gregos, latinos, além do tupi-guarani para a sua formação. Seria de bom alvitre conhecer o significado de palavras estrangeiras antes de portar em suas vestes.

Uma jovem tinha na sua camiseta a palavra butcherly (assassina, açougueira), seria presa se um policial soubesse o significado. Cuide-se também, ao usar gíria, pois falar a uma jovem que ela estava numa reunião bacana é ofensivo. Bacana vem de bacanal que significa orgia.

É verdade, que com o passar do tempo, os vocábulos mudam de sentido, a língua é um fenômeno social, pelo uso, o povo determina o sentido dos termos, portanto, “bacana” poderá ainda significar bonita, boa, assim como manteiga, denominação de uma bolsa de couro para encher de gordura, é, hoje, a própria, e “andrea”, que quer dizer homem, pode ser nome de mulher.

A expressão nordestina corta-jaca era usada como cupido desde 1895. Chiquinha Gonzaga e Machado Careca compuseram um maxixe chamado Corta-Jaca, e tocado por Catulo da Paixão Cearense, ao lado da primeira dama Nair de Tefé, na noite de despedida de Hermes da Fonseca. Foi um escândalo, mereceu, no dia seguinte, um discurso reprovador de Ruy Barbosa.

Os costumes e o sentido das expressões idiomáticas mudam!

Que Deus maravilhoso, deu-nos esse dom para comunicarmos com nossos semelhantes, e com nosso próprio Criador!

 

Como ninguém conseguiu explicar os textos gaúcho e nordestino, estou livre de comprar bombom, mas deixo aqui o significado de cada um.

Linguagem gaúcha:

Ganhei um convite para ir a uma fazenda. Passei umas 13 lombadas e 4 semáforos, então vi uns homens sem o que fazer, na verdade era um grupo grande de homens e umas mulheres desocupados que me ensinaram onde era a propriedade.

Olha! Foi uma luta para chegar antes do churrasco de chão (espetos com carne cravados ao redor de buracos com brasas), tinha bisteca, ponta de costela, vazio, e frango assado, chá mate e mexerica aos montes. Nossa! Menina, tinha até sanduíche, muito bom, deu até vontade de fazer uma marmita. Logo que cheguei vi o baile.

As moças muito bem vestidas, os moços com as vestes gaúchas, botas, esporas e cintos largos com bolsos, apresentando um sapateado entre duas lanças no chão num palanque em cima de um brejo. Eu estava à toa, e pronto, armaram-me uma cilada, fizeram-me participar da disputa, eu tinha de laçar uma bezerra antes dos vaqueiros.

Como não sou bobo, vi no meio de uns cavalos molengos, um tordilho, montei, toquei-lhe a espora e lacei duas pelos chifres, de uma só vez. E não estou mentindo! Meu bolso ficou cheio! Na volta peguei a estrada, encontrei um menino triste e dei-lhe uns reais e fui descida abaixo. Na estrada asfaltada, tomei uma trombada, fui ao funileiro em frente ao açougue. Barbaridade homem! Lá se foi meu dinheiro.

Nordestinos:

Sou um homem valente. Vi um homenzinho, magrelo, preocupado, com camiseta larga, mal arrumado, querendo conquistar uma moça caolha e pernas tortas. Aí eu quis ser o cupido e disse ao baixinho, Endoidou? Preste atenção, não seja abobado.

Amanhã não encha a barriga, nem apressado, não venha mal vestido, mostre-se corajoso, não um frouxo, nada de desistir. Noutro dia o rapaz veio com um roupão de couro como se ele fosse alto. Eu disse: leve a moça comer abóbora com carne seca e mandioca, depois vão ao forró. Vai ser muito bom! Não seja pão-duro.

 

ARTIGO escrito por Leondenis Vendramim, professor de Filosofia, Ética e História. Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião do jornal. São de inteira responsabilidade de seus autores.

Jornal O Semanário

Esta notícia foi publicada por um dos redatores do jornal O Semanário, não significa que foi escrita por um deles, em alguns dos casos, foi apenas editada.

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