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Crônicas – Indizível aos olhos confinados

Bruno Bossolan - www.brunobossolan.blogspot.com

Convulsionar teoremas. expansão ignóbil. transitar-me outra vez pelas sendas da putrefação. azedume cíclico. desempenho ávido para voltar. momentos em que me ser não é suficiente. radiação da pele que não estanca. sofro da exclusão precipitada. desfio a molecularidade da angústia no assoprar de cada revolução solar. detive-me ainda embrionário ao não arrancar explosivo contra a solicitude do convívio. velas de outrora aqueceram o meu luto. velaram-me esquecimento. hoje eu sou espanto. circundo caminhos em contrapassos baqueados. pelo desequilíbrio linguístico deterioro as nuances da minha projeção bípede. enluaro-me conforto hemorrágico. exponho o sistema digestivo como forma de amar. tenho raros lapsos de felicidade. a cada vez que choro em segredo sei que alguém me pressente. desterro-me sombra aos tantos desventurados. que eu me conserve puro após a alvorada. chegou o momento de me encarcerar silêncio. absurdamente distante. procuro-me nas lembranças e me perco nas paisagens. então me retalho aos poucos para não congelar. e faz tempo que esfrio. mastigo ilusões. esse é o meu rito anestésico. satisfação de pirar em cada ato. absorvo o ápice e me encontro no gesto. me encolho na cama quando chega a vez do rebento. na verdade sempre me esqueço sozinho. não posso dormir sem que o tempo me ouça. afasto a coragem e me aprisiono no sufoco. deveríamos ser corpos e não dependentes dos sentires silenciosos. mas o desencontro não costuma se responsabilizar pelo vício. o remédio natural fixa costumes e cria pesos nas tentativas. inocentes ridicularizados pelas explosões da ansiedade cardíaca. o cheiro da memória é inverossímil para quem não sabe esperar. é por isso que ando violentado. sonho com os abutres e propago o meu inferno com as passadas desajeitadas. eu sou um colapso e não pretendo levantar. locutor da própria devastação. não é tão engraçado quando se carrega o próprio defunto. e essa lágrima empedrada que não rola só me faz crescer o tumor da tristeza no âmago. nenhuma fuga pode me trazer o sorriso. estou todo arrebentado e abusado. sinto vergonha em falar que escondo o passado que abusou da minha passividade. não há carícia que me acalme. não há uma palavra que me toque. não há em mim o que eu fui. é a tragédia da mutação humana em função do crescimento quando se finge esquecer. ainda dói. em posição fetal largado na cama. e ao longe Cartola me diz que as “rosas não falam”. acho que entendo perfeitamente a sua sombra no nosso silêncio. enfio os olhos na carne esfolada cheirando à asfalto fervoroso enquanto gemo com a fobia de não me reconhecer num monte de coisa alguma. passo indizível vendendo dons para os bem-aventurados que se negam a pagar com a atenção da surdez. por um gole de vazies carrego as injúrias das feras amansadas por uma casta de valores. um cercado de madeira separa a minha fragilidade de reprimir-me. dos lobos que me ferem em vontades só me afeiçoei com a ineptidão. colho nesse campo de esporros a distração de apaixonar-me pela silhueta do ontem. semeadura da qual não faço ideia de como veio parar aqui. é o impacto do suor que ferroa em fatalidade. contei os dias como se fossem criaturas peçonhentas saturando a passagem secreta por entre seus segredos para estancá-la em mim. mas tentar ir além dos vícios é o perigo que ninguém se atreve em morder. arranhar. fincar. porque a somatória disso tudo se dá em uma vida. aprimora-se num instante. enternece o ato. corrói-nos no momento. mas o tremor é o aguardo por uma ânsia que se cala na repetição do querer. já não somos abrasivos. éramos o mesmo sonho. resta-nos o fim.

Jornal O Semanário

Esta notícia foi publicada por um dos redatores do jornal O Semanário, não significa que foi escrita por um deles, em alguns dos casos, foi apenas editada.

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