Arnaldo Divo Rodrigues de CamargoColunistas

Dizer não também é um ato de amor

Arnaldo Divo Rodrigues de Camargo é especialista em dependência química pela USP/SP-GREA

A advogada Tereza (nome fictício), mãe de um adolescente, percebeu que ele andava com o comportamento diferente. Que o desempenho na escola caiu e ele começou a andar com uns garotos que ela não conhecia e nem a família era de seu relacionamento. E confessa que passou muitas noites atrás dele, preocupada, aflita.

No ápice do desespero de ver o filho se modificar mais a cada dia, Tereza resolveu buscar ajuda primeiro para ela. E a atitude dela deu certo. Ela procurou um grupo familiar Nar-Anon (Amigos e Familiares de Narcóticos Anônimos). Ninguém lhe ordenou o que fazer, mas sugeriram através das ferramentas do programa estabelecer limites em seu relacionamento e cuidar primeiro de si – “fazendo com que se respeite o meu quadrado”, lembra ela, emocionada.

Quando o filho começou a sair com o carro da mãe, logo ocorreu o primeiro acidente. E a advogada foi clara com ele, dizendo: “Você vai ter mais uma chance. Não beba, não use drogas. Você já teve a experiência em nossa casa com seu pai (a mãe era separada do marido, dependente químico). Não faça nada em que depois eu não possa ajudar você.

“Os filhos dos outros bebem, entretanto, meu filho bebe demais e provocou uma batida com o veículo, agora alterado pelo álcool. Nunca mais dei a ele meu carro”, diz Tereza, cumprindo sua palavra.

“Passaram-se os anos, e ele, cursando a faculdade e precisando fazer estágio, apelou para mim”, diz a advogada, “pedindo que desse o meu carro ou então comprasse um veículo usado para ele. Lembrei a ele o acontecido e o que tinha dito: que não fizesse nada em que eu não pudesse ajudá-lo.

“O pai comprou para ele um fusca, usado, mas em bom estado de conservação.

“Um sábado, três horas da manhã, ele me liga, dizendo que estava com umas amigas e com o carro preso porque fora parado num comando da polícia e não quis fazer o exame do bafômetro. Repeti o que tinha dito: não faça nada em que eu não possa ajudar você.”

E Tereza continua:

“Eu prometi não lhe dar carro, e cumpri. E adverti você que quando estivesse trabalhando poderia comprar com seu dinheiro. Quem facilitou e deu o carro para você? Desculpe, mas vou dormir. Você está atrapalhando o meu sono.”

E conclui:

“Hoje sei que foi uma vitória para mim e para meu filho, uma atitude com coragem e amor, que o ajudou a amadurecer, a se responsabilizar por seus atos. Ele conseguiu levar adiante seus estudos, se formar, conseguir aprovação num concurso público e ter sua família.”

ARTIGO escrito por Arnaldo Divo Rodrigues de Camargo é especialista em dependência química pela USP/SP-GREA
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Jornal O Semanário

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