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O Estraga Prazeres!

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Não era por maldade, aliás, criança dificilmente faz coisas por maldade, mas lembro que com essa minha mania de raciocinar logicamente, e tenho isso desde muito criança, estragava muitas brincadeiras que os adultos faziam conosco, e não conseguia ficar quieto e dizer que aquilo era impossível!

A mais clássica era uma que toda vez que o nono Quibao passava embaixo do pontilhão sob a SP-101, ligando Rafard e a fazenda São Bernardo, ele, ao volante do belíssimo Aero Wills Verde Cassino ano 67, mandava a gente baixar a cabeça, pra não bater no pontilhão.

E eu no banco da frente – olha o perigo, criança no banco da frente, e às vezes, duas ainda, e sem cinto de segurança – do alto de meus 5 anos retrucava: Nono, não precisa baixar a cabeça, pois o teto do carro é mais alto que nossas cabeças, e ele bateria primeiro.

Sem querer, e sem maldade eu quebrava a magia, pois ele, meu primo Tadeu e Edmilson baixavam a cabeça. Tinha sempre mais gente no carro, mas nas névoas do tempo não me lembro se também baixavam. Essas viagens noturnas eram pra fazer as celebrações católicas nas fazendas São Bernardo, Capuava, Santa Lídia, estas que a gente tinha que passar embaixo do pontilhão, e a Taquaral que era sentido Tietê.

Como coisas simples assim nos marcam pela vida toda, mesmo sendo mito racionalista, sempre gostei de causos de fantasmas e numa dessas celebrações na fazenda Taquaral, onde perto do campo tinham árvores altas, numa noite dessas eu nem prestei atenção na celebração, pois fiquei imaginando estórias de fantasmas, ouvindo o uivo do vento nas folhas das árvores.

Como coisas assim deixam marcas em nossa memória, que são reativadas por gatilhos externos, como alguma foto, perfume, sabor de algum prato, nesse devaneio em minhas memórias, lembro que na época fumar era charme. Meu pai, mesmo casado, nunca fumou na frente de meu Nono Quibao, nem meus tios fumavam. Essa lembrança me veio agora, pois na época do MOBRAL, minhas tias Ana e Tere davam aulas noturnas para os adultos na fazenda Itapeva, onde morávamos na venda. Uma das salas ficava na “casinha”, uma casa de 3 cômodos que ficava ao lado da venda, e a outra na escola da fazenda, por isso o nono ficava em casa durante as aulas, e meu pai aguentava firme sem fumar até ele ir embora.

Pra mim o nono em casa era uma felicidade e não desgrudava dele, mesmo quase sempre estragando as brincadeiras dele.

Ainda no rol das lembranças, na minha cabeça de criança, que com 6 anos já estava no primeiro ano e na minha lógica, andar com dinheiro no bolso e saber ler era coisa de adulto, não entendia porque “gente grande” tinha que aprender a ler. Hoje tenho que render minhas homenagens aos heróis, que com seu facão tiravam do corte da cana o sustento de suas famílias, e ainda, depois de um dia estafante de trabalho, achavam forças para estudar a noite.

Falando desses heróis, lembro com saudade dessa época, que eu moleque curioso, ficava grudado nos fregueses da venda quando voltavam todos cheios de cinza de cana e iam tomar uma pinga pra descer a poeira, e trocar uns dedos de proza entre eles. Ao saírem, aqueles heróis, levavam sempre alguma coisa pra casa, uma mistura, normalmente um pedaço de mortadela, sem fatiar, pois não tinha maquina, uma lata de sardinha, ou um pedaço de “queijo duro”, além de balas ou doces para as crianças!

Era uma vida cheia de lutas, mas agora entendo a expressão de orgulho nos olhos deles, orgulho de serem os provedores de uma família que era unida pelo amor e respeito! Aos que tiveram a paciência de me acompanhar nessas lembranças, agradeço, pois é minha forma de homenagear cada um dos citados, que de uma forma ou de outra são heróis anônimos que criaram famílias e gente de bem, sem os quais, eu não teria escrito essas linhas e muitos dos que estão lendo também não estariam aqui!

Jr. QuibaoRafard 20/04/2018 16:20

Jornal O Semanário

Esta notícia foi publicada por um dos redatores do jornal O Semanário, não significa que foi escrita por um deles, em alguns dos casos, foi apenas editada.

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