Opinião

Traços de caráter: andar a segunda milha

15/05/2015

Traços de caráter: andar a segunda milha

Artigo por Leondenis Vendramim
Leondenis Vendramim é professor de Filosofia, Ética e História (Foto: Arquivo pessoal)
Leondenis Vendramim é professor de Filosofia, Ética e História (Foto: Arquivo pessoal)

“E se alguém te obrigar a andar uma milha vai com ele duas” (Mat 5:41). A palavra usada por Jesus para “obrigar” é aggareuõ que significa forçar a trabalhar. Naquele tempo, os romanos usavam o vocábulo para “obrigar” os prisioneiros a fazer suas tarefas e carregar seus fardos. Exemplo, quando Jesus sucumbiu debaixo da cruz, os romanos “obrigaram ao cireneu, Simão, a carregar a cruz de Cristo (Mat 27:32).

Os israelitas eram orgulhosos por se julgarem “filhos de Abraão”, povo escolhido por Deus, mas em 63 a.C. os romanos invadiram Jerusalém e impuseram vexatórias humilhações aos judeus, entre as quais a de carregar, obrigatoriamente, os fardos dos romanos, seus inimigos, por uma milha. Era odioso ao israelita caminhar ao lado de um gentio, e pior, carregando um fardo pelas poeirentas estradas ao lado do seu inimigo. Foi diante deste cenário que Jesus ensinou a caminhar espontaneamente duas milhas. Que ensinamento para duas nações inimigas! Se desobedecessem ou queixassem da obrigatoriedade estariam como que convidando o castigo com açoites. Cumprindo obrigatoriamente a primeira estariam aceitando e declarando sua inferioridade, andando a segunda, estariam proclamando sua independência e superioridade, concomitantemente desarmariam o opressor. Como pensa H. E. Fosdick: habituar-se a fazer de bom grado mais do que foi ordenado situa o escravo a status de livre; andar a primeira milha é faina ingrata, a glória vem na segunda. Schwantes escreve: “Aqueles que só trabalham porque a isso são obrigados, nunca chegam a descobrir o prazer e a bênção do trabalho criativo e espontâneo… Fazendo mais do que o dever impõe, transmutam a obrigação em privilégio e oportunidade… Alcançam a liberdade superior de trabalhar não porque precisam, mas porque querem… guindam-se acima da tirania…” Colunas do Caráter, p 116.

Os alunos que estudam e fazem as tarefas que lhes são impostas pela exigência dos pais e mestres, desconhecem os encantos e enlevos proporcionados pela pesquisa e pela descoberta da verdade e dos horizontes, e assim continuam na mediocridade dos parcos resultados, do cansaço, e enfado que o estudo coercitivo produz.

Quando o estudo e as tarefas são realizados de modo próprio, voluntário, sobrepuja a obrigatoriedade e a escravidão além de dar um sentimento de dignidade e valor pessoal. S. Paulo e Silas estavam presos num calabouço úmido, acorrentado, não por alguma transgressão, mas porque falava e enaltecia a Jesus. À meia noite eles oravam e cantavam. Houve um terremoto e as prisões se abriram. O carcereiro temendo a fuga dos prisioneiros tentou o suicídio, mas Paulo gritou que todos ali estavam. Então o carcereiro os curou e aliviou suas dores. Quem se sente escravo, faz o trabalho de escravo, faz somente o que lhe é ordenado e sofre piores consequências; quem se vê como livre, executa mais do que o mandado, sente alegria pelo trabalho feito e se sente vitorioso. A primeira milha é o dever, a segunda é o amor.

Ana Nery, na guerra contra o Paraguai, socorria os feridos fisicamente, e lhes aliviava o sofrimento moral com palavras de estímulo e esperança, mostrava-lhes sorriso, atenção e assim cumpria não só a primeira milha, mas a segunda. O médico profissional cumpre suas obrigações para com os enfermos, o de senso humanitário vai além, cuida os seus pacientes com amor. O funcionário da primeira milha é pontual, cumpre suas obrigações, o da segunda trabalha com esmero e faz além de suas tarefas, por idealismo e não pelo salário, por amor, não por vantagens pessoais. Martin Luther King deixou o conforto do seu lar e empenhou-se à mudar a opinião pública, para melhor educação, dignidade, direitos civis dos negros e acabar com a discriminação racial. Dr King foi assassinado aos 39 anos, sem ver os frutos de seu trabalho de segunda milha pelo próximo. Jesus o maior exemplo de andar a segunda milha, sendo Deus, amou-nos tanto, que assumiu a natureza humana, e como homem, sofreu morte tão cruel e dolorosa para salvar, não o bom, mas pecadores e degradados como você e eu. Deus nos ajude a copiar Seu exemplo e andar a segunda milha, principalmente dentro do nosso lar.

Jornal O Semanário

Esta notícia foi publicada por um dos redatores do jornal O Semanário, não significa que foi escrita por um deles, em alguns dos casos, foi apenas editada.

Artigos relacionados

Botão Voltar ao topo
Abrir bate-papo
Olá
Podemos ajudá-lo?