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A figura do caipira como expoente do folclore regional

Um dos principais pesquisadores do folclore brasileiro, Câmara Cascudo define o termo caipira como “morador do mato” (caipora, do tupi-guarani). Eternizada no cinema por Mazzaropi, a figura do caipira, aquele cidadão ligado ao campo com identidade e cultura próprias, pode não ter mais tanto espaço no século XXI, mas ela permanece viva como parte do folclore regional. Comemorado na próxima segunda-feira, 22, o Dia do Folclore surge como uma oportunidade interessante para conhecer um pouco mais sobre esse personagem de dialeto particular tão ligado à história das cidades do interior de São Paulo.
“Sou nascido e criado em Capivari. Não posso negar minhas raízes, puxo os ‘erres’ e sou caipira mesmo”, diz o aposentado Francisco Benedito Ferreira.
Até meados do século XX, o caipira, de fato, era um sujeito que cultivava hábitos e costumes que justificavam a rotulação. No entanto, com a popularização de meios de transporte e comunicação de massa, o comportamento do homem do campo sofreu influências e foi sendo padronizado a modelos urbanos ao longo do tempo.
Enquanto a figura do caipira foi se perdendo com o decorrer dos anos, a palavra ganhou uma nova acepção, um tanto ligada à timidez. Mas, de modo geral, quando se fala do folclore caipira, alguns elementos clássicos que compõe o estereótipo do típico morador do campo são lembrados, com destaque para o dialeto.

Dialeto
Característica típica do sotaque caipira, a pronúncia de palavras com o “erre” puxado, como em porta, por exemplo, e outras particularidades do dialeto praticado nas cidades do interior paulista levaram o poeta e folclorista capivariano Amadeu Amaral a lançar, em 1920, o livro “O Dialeto Caipira”, uma das principais referências literárias sobre o assunto até hoje.
Já no início do século passado, o folclorista já indicava que o predomínio da “caipirice” estava perto de sofrer mudanças. “Ao tempo em que o célebre falar paulista reinava sem contraste sensível, o caipirismo não existia apenas na linguagem, mas em todas as manifestações da nossa vida provinciana. De algumas décadas para cá tudo entrou a transformar-se. A substituição do braço escravo pelo assalariado afastou da convivência cotidiana dos brancos grande parte da população negra, modificando assim um dos fatores da nossa diferenciação dialetal. Os genuínos caipiras, os roceiros ignorantes e atrasados, começaram também a ser postos de banda, a ser atirados à margem da vida coletiva, a ter uma interferência cada vez menor nos costumes e na organização da nova ordem de coisas. A população cresceu e mesclou-se de novos elementos. Construíram-se vias de comunicação por toda a parte, intensificou-se o comércio, os pequenos centros populosos que viviam isolados passaram a trocar entre si relações de toda a espécie, e a província entrou por sua vez em contato permanente com a civilização exterior. A instrução, limitadíssima, tomou extraordinário incremento. Era impossível que o dialeto caipira deixasse de sofrer com tão grandes alterações do meio social”, relata em trecho da obra.
Amaral também afirma que o “caipira torna-se de dia em dia mais raro” e seu dialeto “acha-se condenado a desaparecer em prazo mais ou menos breve”. É válido lembrar que isso foi escrito há 91 anos. Ao longo desse período, o êxodo rural e o aumento no número de escolas contribuíram para que verbetes corriqueiros do dialeto caipira (veja em quadro abaixo) fossem saindo de uso. O puxar do “erre” e algum vocábulos, porém, seguem vivos. “Os cariocas falam de um modo diferente e eles gostam disso. Nós puxamos o “erre” e falamos algumas palavras caipiras e eu gosto disso. É uma característica nossa, tem de ser valorizada”, diz o aposentado Francisco Benedito Ferreira.

A explicação
O folclorista capivariano escreve que o tom geral do frasear do caipira “é lento, plano e igual, sem a variedade de inflexões”. Isso, segundo ele, “enriquece a expressão das emoções na pronunciação portuguesa”.
Quanto ao fato do “erre” ser sempre puxado, Amaral explica tecnicamente a situação: “Na sua prolação, em vez de projetar a ponta [da língua] contra a arcada dentária superior, movimento este que produz a modalidade portuguesa, a língua leva os bordos laterais mais ou menos até os pequenos molares da arcada superior e vira a extremidade para cima, sem tocá-la na abóbada palatal. Não há quase nenhuma vibração tremulante. Para o ouvido, este r caipira assemelha-se bastante ao r inglês. É, muito provavelmente, o mesmo r brando dos autóctones [índios]. Estes não possuíam o rr forte ou vibrante, sendo de notar que com o modo de produção acima descrito é impossível obter a vibração desse último fonema”.

Termos caipiras

Em “O Dialeto Caipira”, Amadeu Amaral apresenta uma extensa lista com palavras típicas do linguajar caipira. Confira algumas: Acauso: casualidade; Adonde: onde; Alembrá: lembrar; Antãoce, antonce, intonces: outras formas de então; Bataiá: batalhar; Catucá: cutucar; Causo: fato, acontecimento; Chicolate: chocolate; Chiringa: seringa; Chué: ordinário, desgracioso; Contia: quantia; Corenta: quarenta; Cremdospadre: creio em Deus padre; Cuié: colher; Culidade: qualidade; Çumitério: cemitério; Decumento ou dicumento: documento; Deferente: diferente; Dereito: direito; Desabotinado: indivíduo meio doido, espalhafatoso; Despois ou despoi: depois; Famia: filho; Fermosura: formosura; Fruita: fruta; Goloso: guloso; Hóme: homem; Imbigo: umbigo; Imbirrância: teimosia; Imburuiá: embrulhar; Inzempro: exemplo; Inzercício: exercício; Inté: até; Meió ou mió: melhor; Nho ou inho: “senhor”; Orêa ou orêia: orelha; Pareiada: aparelhada; Porquêra: porcaria; Precurá ou percurá: procurar; Pregunta ou progunta: perguntar; Premêro: primeiro; Quage: quase; Saluço: soluço; Sastifa: satisfação; Sequio: sequilho; Vacê, vancê, vassuncê ou vossuncê: você.

Atividades pedagógicas lembram Dia do Folclore nas escolas
Nas escolas da rede municipal de Capivari, atividades pedagógicas em diferentes disciplinas da grade curricular serão desenvolvidas pelos estudantes em comemoração ao Dia do Folclore (22), de acordo com a Secretaria de Educação.
Em Rafard, segundo a Diretoria de Educação, durante toda a próxima semana os alunos das escolas municipais participarão de atividades relacionadas ao Dia do Folclore, entre elas construção de brinquedos, desenvolvimento de cantigas, rodas e danças, além de parlendas (brincadeiras infantis sobre o folclore brasileiro). Alguns dos trabalhos feitos pelos estudantes também serão expostos dentro das escolas.

Jornal O Semanário

Esta notícia foi publicada por um dos redatores do jornal O Semanário, não significa que foi escrita por um deles, em alguns dos casos, foi apenas editada.

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