ArtigosJ.R. Guedes de Oliveira

Cento e vinte anos do nascimento do Poeta

João Prata foi um extraordinário articulador. Enveredou-se pelos caminhos da literatura poética e da prosa, não deixando de pensar e propor um desenvolvimento maior para a sua cidade. Se apanharmos os jornais das décadas de 30,40 e 50, notaremos, em seus escritos nas colunas dos jornais, a sua ânsia incontida de uma Capivari dinâmica, capaz e progressista.

Quando sentimos o sabor de sua poesia, de seus lances literários, de seus artigos refletivos, pensamos, como ele, numa cidade que manteve e mantém uma tradição das mais ricas e férteis.

Foi, por conseguinte, um homem voltado para as suas raízes, para as suas coisas, não deixando de pensar, um minuto sequer, nas melhorias de sua cidade natal.

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Orgulho da literatura interiorana, capaz de perpassar por todos os cantos da cultura nacional, João Prata cultuou, como ninguém, o sabor pelas letras e pelo correntio uso da nossa queria e opulenta língua portuguesa.

Menino pobre, de berço rico em educação, soube vencer pelos seus méritos. Compartilhou, com estreita amizade com o seu confrade Rodrigues de Abreu. Viveu a poesia e dela fez um caminho aberto, num país que, lamentavelmente, não obstante a fecunda literatura e sua produção, pouco se lê. Os livros são caros. Os incentivos são poucos e, assim mesmo, voltados às produções de luxo. Nisso, cabe a repreensão de que devemos repensar o sistema editorial brasileiro, dando condições para que editoras mais, de gabarito e de presteza para com a nossa sociedade, possam caminhar com mais desenvoltura e livres dos apertos que, sabemos, vivem em nossos dias.

Mas, contudo, João Prata abriu uma esperança maior, ao dedilhar a sua lira e a produzir as mais belas páginas da poesia nacional. Podemos situá-lo entre os grandes. E vejam, pois, que os seus poemas são verdadeiras doçuras e encantos, ao sabor das nuances que sofreu, na sua passagem terrena. Os amigos, os admiradores, as grandes figuras literárias não lhe faltaram um instante sequer, malgrado a sorte que lhe não sorriu nas suas condições financeiras. Mas o tempo inexorável nos dá a lição da grandeza. Os vultos célebres, das grandes decisões do poder de criação, são sempre bálsamos a nos acalentar nesta trajetória insofismável para o porvir.

João Prata é hoje lembrado com merecida exaltação. A nossa modesta contribuição, ou seja, de todos nós aqui presentes, é um pouco da paga pelo que ele nos proporcionou no jornalismo, na poesia, na prosa e nas suas atividades profissionais.

Saldar, o poeta, elevando-o aos píncaros da poesia clássica, o romantismo supera a tudo e, como um pastor de ovelhas, permitimo-nos dizê-lo assim ele passou perene por esta terra.

Avivar a sua memória, como estamos fazendo, todos nós, significa dizer que não esquecemos o nosso passado. Não é simplesmente viver do passado, mas dar o seu devido crédito, para que as nossas gerações tenham-no como exemplo edificante.

Lembramos, pois, de que cultuar a memória daqueles que se foram, dando-lhes o devido crédito, significa honrar o passado, num presente, visando o futuro alvissareiro.

Cento e vinte anos do nascimento do Poeta
Cento e vinte anos do
nascimento do Poeta

Finalizando, nada mais a acrescentar, a não ser a reprodução poética de João Prata que, magistralmente, sintetiza a sua própria vida, como uma espécie de autobiografia:

ANTES NUNCA…
Quando sai da escola – e era um menino
de doze anos, se tanto, inteligente,
diziam os meus mestres, mas franzino –
entrei logo, para uma tipografia,
e fui um aprendiz muito paciente,
quer com os ralhos do chefe atrabiliário,
quer com a entrega pontual do semanário,
que um mulato político escrevia.

Depois, crescendo, fiz-me jovem. Tinha
do velho redator quase uma inveja
– pena fácil demais com que entretinha,
toda tarde de sábado, o leitor:
que vontade incontida, então, me vinha
de afinal, moço já, fazer jornal,
porém, a sua feitura espiritual,
ser, como o tal mulato, um redator.

Aos vinte anos, já redigia a folha,
com tal orgulho e tanta ingenuidade
– vaidade ingênua que era apenas bolha
de sabão dessas aspirações primas –
e era grande a responsabilidade,
rude mister – que até acabei gostando
de verso, de soneto, e fui tentando
metrificar, garatujando rimas.

Pois, hoje, escrevo versos, faço poemas,
sonetos e editado livros tenho.
Mas, e as minhas aspirações supremas,
em que deram? Não vejo. Ninguém vê.
Poeta! Um fracasso o meu sonhado empenho…
Ninguém gosta de versos – e eu me rio! –
que nem passo de boêmio e de vadio,
nem a própria mulher que amo me lê!

Antes nunca tivesse, um dia, entrado
para a oficina da tipografia,
onde fui aprendiz enfeitiçado
pelo cargo maior de redator,
que, já adulto, afinal, eu exercia,
para acabar, como acabei, rimando,
fazendo versos ruins e, até, encontrando
Amada – para hoje sofrer de amor!…”

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