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Contos do Caipira: Bola de fogo

Este causo que eu vô conta aconteceu lá com o meu tataravô.
Histórias de boitatá, bola de fogo, sempre se falô.
Mas o nhô Pedro, era boa pessoa, mais era abusadô.
Dizia assim pros amigos: “e foi assim que um parente me contô”.
Tinha seu cavalo, sua charrete, era corajoso, e um dia desse jeito comento:
“Se cruzá o meu caminho, essa tar bola de fogo, eu corto no facão, e nem confiança eu dô”.
Assim nhô Pedro dizia, e o tempo passô.

Numa noite, nhô Pedro vortava sozinho naquela estrada de mato serrado, o caminho que era feito passage pro gado.
Ele vinha com seu cavalo, sossegado,
e naquela estrada alguma coisa o deixô cismado.
Mas não ligô.
Só que, ao tempo que ele caminhava, uma tar bola de fogo o acompanhava.
Até que, na sua frente, parô a tal bola de fogo!
Parecia querê enfrentá o meu tataravô.
E como já havia dito, puxou o seu facão e esperô.
Rá, num demorô!
E montado no cavalo continuô, seu cavalo refugô.
Mas ele não desistia. Cada batida com o facão era fogo que saía.
E essa bola era tão ligeira!
No chão ela não caía.
Nhô Pedro ali, ói, num largava do facão!
E parece que, quanto mais batia, mais essa bola de fogo o perseguia.
Ele não errava nenhuma batida, e do cavalo não caía.
Ah, mais essa bola de fogo voava pra todo lado, tinha hora que nem se via!
Parecia que dobrava de tamanho, ora pequena, ora crescia.
Até que tudo silenciô, e o Nhô Pedro em casa não aparecia.
Então foram à procura. Saíram uns amigos e uns parentes até encontrá.
E quando acharo, o cavalo tava num canto de cerca, assustado.
E Nhô Pedro
no chão deitado, desfalecido.
O cavalo fumegava pelo nariz
com a serração que caía.
Do lado do Nhô Pedro, o seu facão. Quem viu ficou admirado!
Facão todo desbocado, teve gente que disse: “parece que ele brigô com as pedra”!
O facão pra mais nada servia, fico lá no rancho um tempão, ninguém mexia.
O mato ficô queimado, e um cheiro forte que sentia.
Quando o Nhô Pedro foi levado pra sua casa, com a famia, fizeram tanta pergunta, mais ele não respondia.
Ficô assim, sem conversá, por muito tempo! Calado.
Até que um dia, dispertô quando seu cumpadre lhe disse ao lembrá daquela conversa:
“O sinhô, por acaso, brigô com a tar bola de fogo?”
Nhô Pedro se assusta, e de zóio arregalado, nessa hora não respondia.
Na mesma hora rezava e se benzia.
Só em sonho ele contô. A bisavó quem contava que, toda noite, ele acordava gritando,
e não dormia.
Nunca mais ele abusô, e nem de casa não saía.

Assim termina essa minha poesia.
Numa certa fazenda, quando à noite, eu também via.
Eram duas bolas que se cruzavam no céu.
Os mais antigos diziam ser um compadre com uma comadre, que, quando vivos, seus companheiros traíam.

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Toninho Junqueira

Toninho Junqueira é locutor há mais de 40 anos, escritor e restaurador de cadeiras antigas e imagens sacras. Desde 2021, conduz sua própria rádio, a São Gonçalo, com 24 horas de programação sertaneja raiz. Fale com o autor por telefone ou WhatsApp: (19) 99147-8069.

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