Rubinho de Souza

Meu pé de milho

Um dia desses eu comecei a rememorar os meus tempos idos no Grupo Escolar Prof. Luís Grellet, e veio à minha memória quando minha professora de Português Dona Leonildes, pediu que nós os alunos escolhêssemos um texto para ler e cada um de nós iria comentar sobre o que tinha compreendido sobre ele – era a chamada aula de “interpretação de texto”.

Eu escolhi este que transcrevo abaixo para que você caro leitor, possa se deliciar com tão agradável leitura da crônica de Rubem Braga (foto).

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Ruben Braga (Foto enviada pelo colunista)

Leia até o fim que vale o tempo dispendido que não é muito. Vamos à crônica:

“Os americanos, através do radar, entraram em contato com a Lua, o que não deixa de ser emocionante. Mas o fato mais importante da semana aconteceu com o meu pé de milho. Aconteceu que, no meu quintal, em um monte de terra trazida pelo jardineiro, nasceu alguma coisa que podia ser um pé de capim – mas descobri que era um pé de milho. Transplantei-o para o exíguo canteiro da casa. Secaram as pequenas folhas; pensei que fosse morrer. Mas ele reagiu. Quando estava do tamanho de um palmo, veio um amigo e declarou desdenhosamente que aquilo era capim. Quando estava com dois palmos, veio um outro amigo e afirmou que era cana.

Sou um ignorante, um pobre homem da cidade. Mas eu tinha razão. Ele cresceu, está com dois metros, lança suas folhas além do muro e é um esplêndido pé de milho. Já viu o leitor um pé de milho? Eu nunca tinha visto. Tinha visto centenas de milharais – mas é diferente.

Um pé de milho sozinho, em um canteiro espremido, junto do portão, numa esquina de rua – não é um número numa lavoura, é um ser vivo e independente. Suas raízes roxas se agarram no chão e suas folhas longas e verdes nunca estão imóveis. Detesto comparações surrealistas – mas na lógica de seu crescimento, tal como vi numa noite de luar, o pé de milho parecia um cavalo empinado, de crinas ao vento e em outra madrugada, parecia um galo cantando.

Anteontem aconteceu o que era inevitável, mas que nos encantou como se fosse inesperado: meu pé de milho pendoou. Há muitas flores lindas no mundo, e a flor de milho não será a mais linda. Mas aquele pendão firme, vertical, beijado pelo vento do mar, veio enriquecer nosso canteirinho vulgar com uma força e uma alegria que me fazem bem. É alguma coisa que se afirma com ímpeto e certeza. Meu pé de milho é um belo gesto da terra.

Eu não sou mais um medíocre homem que vive atrás de uma chata máquina de escrever: sou um rico lavrador da rua Júlio de Castilhos.

Na época em que li pela primeira vez essa crônica, era como se estivesse vendo a casa, o canteiro próximo ao portão, e o pé de milho tal como descrito pelo autor, de tal forma que tudo ficou gravado em minha memória e hoje ao ver uma planta semelhante começando a brotar num monte de areia num canto da minha casa, lembrei do meu xará autor, e tal como ele disse também digo: – Eu não sou mais um medíocre homem que vive atrás de um chato computador, sou um rico lavrador da rua Dr. Soares Hungria.logo do fundo do baú raffard

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