Carta do Leitor

Ao completar 50 anos de sua entrada no Exército, o capivariano Roberto Alves se lembra da perseguição a Carlos Lamarca

“Com a experiência que eu adquiri no exército e principalmente por eu ter participado da operação militar para capturar os guerrilheiros no vale do Ribeira e de uma manobra de guerra, tenho a dizer que todos nós devemos plantar a sementinha da paz todos os dias. Paz com os nossos semelhantes, paz entre nações. Guerra jamais”.

Esta foi a declaração do capivariano Roberto Alves, hoje com 69 anos e aposentado. Alves contou a nossa reportagem sobre a sua passagem pelo Exército Brasileiro no período da Ditadura Militar. Serviu Itu e guardou vivo na memória sua principal missão a de capturar um grupo de militares desertores comandados pelo guerrilheiro o Ex-Capitão do Exército Carlos Lamarca. No ano de 1970, o Brasil vivia em pleno Regime Militar que teve seu início com o golpe Militar de 31 de março de 1964, podemos definir a Ditadura Militar como sendo o período em que os militares governavam o país. Esta época foi de 1964 a 1985, caracterizou-se pela falta de democracia, supressão de direitos constitucionais, censura, perseguição política e repressão aos que eram contra o Regime Militar.

O 1º presidente depois do golpe foi Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco, 2º Marechal Arthur Costa e Silva, 3º General Emílio Garrastazu Médici, 4º General Ernesto Geisel, 5º e último presidente General João Baptista de Oliveira Figueiredo, e foi durante o período do governo Marechal Costa e Silva, que no dia 13 de dezembro de 1968, ele decretou o A I 5 – Ato Institucional Número 5.

Este foi o mais duro ato do governo militar, pois aposentaram juízes, caçou mandatos, acabou com a garantia de habeas corpus e aumentou a repressão militar e policial, a repressão a luta armada cresceu e uma severa política de censura foi colocada em execução, jornais, livros, peça de teatro, filmes, músicas e outras formas de expressão artísticas foram censurados. Muitos professores, políticos, músicos, artistas e escritores foram investigados, presos, torturados, mortos ou exilados do país.

Capivariano Roberto Alves, durante passagem no Exército Brasileiro e hoje (Foto: Arquivo pessoal)
Capivariano Roberto Alves, durante passagem no Exército Brasileiro e hoje (Foto: Arquivo pessoal)

Entre muitos fatos importantes que aconteceu no período em que vivi no exército, um deles foi a grande festa no dia 25 de agosto, dia do soldado, em homenagem ao patrono do Exército Brasileiro Luís Alves de Lima e Silva Duque de Caxias, outro evento foi a comemoração da proclamação da Independência do Brasil por D. Pedro I, em 7 de setembro de 1822 nós fomos desfilar em São Paulo. Outro fato importante foi uma manobra de guerra que era feita a cada 4 anos, manobra de guerra é uma simulação de guerra só não tendo o inimigo pela frente. Porém o acontecimento que realmente marcou a carreira de Roberto Alves foi quando ele e uma boa parte dos soldados do Quartel de Itu junto com outros soldados do II Exército foram convocados para partir para o vale do Ribeira nas matas do município de Guapiara para cercar toda a região e capturar o guerrilheiro e seus companheiros o Ex-Capitão de Exército Carlos Lamarca, Lamarca era muito experiente e estava no meio da mata treinando os seus companheiros para a guerrilha. Nós ficamos lá no período de 40 dias, nós fazíamos patrulha durante o dia e a noite dormíamos no meio da mata de 2 e 2 soldados e revezava enquanto um dormia outro ficava de tocaia.

Lamarca

No ano de 1969 o capitão do Exército Carlos Lamarca que servia no Quartel de Infantaria na cidade de Quitaúna, fugiu carregando uma Kombi muitos armamentos e munições. Vários oficiais, sargentos, cabos e soldados o seguiram, Lamarca era quem comandava, buscava organizar a luta armada e através da guerrilha derrubar o governo militar. Lamarca era inspirado na Revolução Cubana e estava convencido que o Regime Militar só seria derrubado pela guerrilha no campo. Lamarca admirava o guerrilheiro Ernesto Che Guevara e sentiu muito sua morte.

Che Guevara junto com Fidel Castro e outros guerrilheiros no ano de 1959 instaurou o governo revolucionário na época quem governava Cuba era o ditador Fugencio Batista, Che Guevara foi um dos mais famosos revolucionário da história, foi considerado pela revista americana Time Magazine uma das 100 personalidades mais importantes do século XX. Che Guevara nasceu no dia 14 de julho de 1928 em Rosário Província de Santa Fé na Argentina ele tentou organizar a guerrilha na Bolívia, mas não deu certo, foi morto pelo exército boliviano no dia 9 de outubro de 1967 com 39 anos. Che Guevara foi médico, fotografo e guerrilheiro. Em 1970 o presidente da república era o General Emílio Garrastazu Médici ele era linha dura, governava com mão de ferro. (Anos de Chumbo)

Como começou a Ditadura Militar

Depois da renúncia do então presidente Jânio Quadros quem assumiu o governo foi o seu vice João Goulart, Jango como era conhecido assumiu a presidência num clima político adverso, o seu governo foi marcado pela abertura as organizações sociais. Estudantes, organizações populares e trabalhadores ganharam espaço causando preocupação aos militares.

Temiam uma guinada do Brasil para o lado socialista, vale lembrar que neste período o mundo vivia o auge da Guerra Fria entre a União Soviética e o EUA.

Lamarca e sua fuga espetacular

No período em que Lamarca e o seu grupo estiveram no vale do Ribeira em que nós ficamos 40 dias procurando os muitos dos guerrilheiros foram presos, alguns se entregaram, mas apesar do grande cerco feito pelo exército com muitos soldados, Lamarca e o seu companheiro Zequinha, conseguiram fugir para o sertão do estado da Bahia, eles queriam organizar a guerrilha lá na zona rural, mas não deu certo, Lamarca e Zequinha foram mortos no dia 17 de setembro de 1971, eles estavam fracos, doentes e encurralados sem poder reagir foram fuzilados pelos soldados do exército da Bahia, estava morta a Vanguarda Popular Revolucionária – VPR.
Carlos Lamarca, nasceu no dia 27 de outubro de 1937 no bairro Estácio – Rio de Janeiro e foi morto aos 34 anos no dia 17 de setembro de 1971.

Lamarca traidor ou herói?

Assim como os outros brasileiros que pegaram em armas contra a ditadura militar, Carlos Lamarca inspira a um só tempo muito ódio e admiração. Desde o momento em que abandonou o quartel de Quitaúna, passou a ser considerado um traidor pelos militares.

Com o concurso de grande imprensa a ditadura o retratou como um terrorista perigoso, capaz dos piores atos de violência. Setores conservadores da sociedade, destacadamente o exército ainda mantém esse ponto de vista. Um texto veiculado por uma entidade formada de militares e chamada de TERNUMA – Terrorismo Nunca Mais, afirma a realidade apesar da audácia, da lenda e do mito. Lamarca foi um desertor e traidor do exército brasileiro e é assim que deve passar para a história.

Lamarca Herói

A imagem negativa do capitão começou a ser publicamente questionada a partir dos movimentos pela anistia aos presos políticos e pela redemocratização do país uma das frentes de luta dessas mobilizações foi a recuperação da memória dos guerrilheiros mortos pelo regime militar. Consolidou-se então, em setores progressistas da sociedade a imagem de Lamarca como herói, um mártir das lutas por justiça social, prova disso foi o ato ecumênico organizado pela igreja católica na cidade de Ipupiara no estado da Bahia, para lembrar os 30 anos de sua morte 17 de setembro de 2001. Um texto especialmente escrito para a ocasião, afirmava quem foi morto defendendo a causa da justiça da democracia e da Reforma Agrária, é um mártir mesmo que sua militância não seja dentro da igreja ou da religião, queremos celebrar a vida e a morte de nossos mártires como um reconhecimento de seu exemplo e como compromisso a causa pela qual derramaram o seu sangue.

Foi feito um filme de Lamarca, do diretor Sérgio Resende (1994 – 130 minutos) com o artista nascido em Rafard, Paulo Betti no papel principal. Este é um resumo do que aconteceu no período que eu estive servindo o Exército Brasileiro, eu tinha 19 anos e agora no ano de 2020 completa 50 anos.

Jornal O Semanário

Esta notícia foi publicada por um dos redatores do jornal O Semanário, não significa que foi escrita por um deles, em alguns dos casos, foi apenas editada.

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